O sushi essencial de Jun Sakamoto

Há mais de dez anos consagrado pela crítica especializada, Jun Sakamoto é unanimidade pela excelência de seus sushis. Segundo Jun, o sushi é uma obra completa, que começa pela escolha dos insumos, os netá (a cobertura do sushi) mais frescos, a técnica para preservar esse frescor, e o imprescindível, a boa harmonização com o shari, o arroz avinagrado do sushi, que é a alma deste prato que hoje representa a culinária japonesa no mundo todo.

Uma recente pesquisa realizada pela TV Globo apontou o sushi como o segundo prato preferido dos paulistanos (o primeiro, claro, foi a pizza), e o primeiro dos pedidos delivery no Rio de Janeiro. Tamanha popularização do sushi, e da culinária japonesa, está provocando um fenômeno de banalização de uma prática secular. O governo japonês solicitou à Unesco o reconhecimento da culinária japonesa como Patrimônio da Humanidade. Esta pauta está presente na agenda prioritária para 2013 do governo japonês, através do Ministério da Agricultura, Florestas e Pesca.

E como é a opinião de Jun Sakamoto sobre esta banalização? “Infelizmente, como tudo na vida, o melhor produto é acessível apenas para uma minoria. Para apreciar uma boa música, uma boa pintura, uma boa obra de arquitetura ou um bom vinho, é preciso um bom repertório”, explica. “Na gastronomia, não é diferente. A pessoa precisa saber o que avaliar num bom sushi, e esta questão está muito além de discernir se ele é saboroso ou não”, argumenta o sushiman, que foi duas vezes campeão na categoria Melhor Restaurante Japonês da premiação promovida pela Revista Veja São Paulo.

Jun Sakamoto: concentração e densidade. Foto: Jo Takahashi

Num cenário que passou pelos anos 80, com a onda de restaurantes japoneses em ascensão, não houve de fato, tempo hábil para a formação de bons profissionais. Os restaurantes passaram a oferecer produtos inventados, adaptados e com cara de japonês. A demanda de público aumentou, mas a evolução não foi correspondida em qualidade. Jun sentencia: “a culinária hoje praticada em boa parte dos restaurantes está se distanciando cada vez mais das origens”.

Gomadofu de edamame (tofu feito com araruta japonesa e soja verde e gergelim), em caldo dashi, com camarão. Uma das possíveis entradas da degustação. Foto: Jo Takahashi

Então, o que faz a diferença num bom sushi?

A qualidade da matéria prima, a técnica de preparo”, explica o artesão. “Um bom sushi você percebe em todos os detalhes: proporção, textura, composição e obviamente, sabor. E no sabor ainda há detalhes a se observar: equilíbrio da acidez, do salgado, da doçura e do Umami (o quinto sabor) em composição com o peixe e os frutos do mar”.

A polêmica de sempre: qual a temperatura ideal do shari (arroz do sushi)?

Aqui, Jun é categórico.  “Pouco acima da temperatura do corpo, só assim ele se mantém leve e delicado. Ao esfriar o arroz endurece e fecha os aromas e os sabores”. De fato, o que se nota em bufês, onde os sushis são servidos em grandes pratos, o arroz já está totalmente frio. Pior ainda nos restaurantes por quilo, onde o bolinho de arroz é compactado, até para pesar mais. Além desses assassinatos, para dar uma sobrevida aos peixes e frutos do mar, os bufês apresentam o sushi no balcão frio, tornando o shari resfriado, ocluindo o tempero, que deveria “voar” na boca.

Jun, administrando temperatura e sabor do arroz shari. Foto: Jo Takahashi

É por isso também que Jun faz questão que os sushis servidos por ele no seu balcão exclusivo sejam provados logo que são postos à sua frente. É para degustar o shari ainda morno, exalando o vinagre que vai se expandir no céu da boca, harmonizando-se com o netá.

Sushi de lula, com sal negro do Havaí.

E para Jun Sakamoto, quais são os conceitos que a boa culinária japonesa deve transmitir?

A culinária japonesa é muito diversificada no Japão, tendo muitos pratos de descendência estrangeira que, com o passar do tempo, foram incorporados à cultura alimentar do povo japonês. Mesmo nessa diversidade eu acredito que o conceito que mais exprime o valor gastronômico do japonês é o respeito à matéria prima. A técnica é voltada para exaltar o valor do sabor de todos elementos usados na elaboração dos pratos japoneses”, conclui Jun.

Sushi de carapau (esq) e peixe serra maçaricado (direita) Foto: Andreas Heiniger

Degustar sushi com Jun Sakamoto é um ritual. Então, escolha um momento especial para comemorar e siga algumas recomendações Jojoscope para que esta experiência seja inesquecível.

  1. O balcão que Jun atende comporta oito pessoas. Por isso, reservas são imprescindíveis. Habituées até se sentam no balcão ao lado, para variar, onde dois assistentes de Jun atendem: José Francisco Araújo, já veterano na casa, e Sérgio Kendi.
  2. A sequência da degustação de sushi é composta por 16 unidades, mais uma ou duas entradas e sobremesa. Nem pense em mudar a sequência dos sushis: ela foi cuidadosa elaborada para ser um roteiro, há uma narrativa que precisa ser degustada com humildade. Caso você não possa comer algum ingrediente (camarão, por exemplo) avise antes.
  3. Cada sushi será servido sobre um bloco de madeira. Não há shoyu no balcão. Jun serve o sushi no estado em que ele deve ser apreciado, já temperado. Às vezes é uma pincelada de shoyu especialmente turbinado, com caldo dashi, à base de alga kombu e peixe seco. Outras vezes, um sal gourmet. Mais recentemente, Jun aderiu ao yuzu, o cítrico japonês.
  4. Não se perca nas conversas com seus parceiros de degustação. Quando chegar o sushi, não perca muito tempo para degustar para garantir a melhor temperatura. E não se acanhe. Pegue os sushis com as mãos. Há uma toalhinha umedecida para limpar os dedos.
  5. Apreciar um sushi exige certa concentração e introspecção. Não se esqueça, é um ritual. É que nem na missa. Ao colocá-lo sobre a língua, sinta o aroma do vinagre exalar, e os grãos umedecidos do arroz se distribuírem por toda a boca. É uma explosão de experiências gustativas, e você só vai poder sentir a profundidade deste momento se estiver quieto.
  6. Entre um sushi e outro, belisque umas fatias de gari, o gengibre curtido, que é servido num potinho, e sempre reposto quando acabar.  O gari tem a função de limpar o paladar, e preparar o espírito para o próximo sushi.
  7. Cada sushi da sequência tem uma personalidade própria. Saiba diferenciar cada uma delas, e o conceito narrativo que Jun impregna nesta storyboard. Os iniciais são mais comuns mas não menos especiais: o atum pincelado com um molho fantástico e o trivial salmão, com o cítrico yuzu. Jojoscope recomenda especial atenção à lula, polvilhada com sal negro do Havaí. É certamente um dos pontos altos da sequência.
  8. Sushi combina com chá. Mas se preferir, champagnes e vinho branco harmonizam bem com o sushi. Em nossa última visita, Jun Sakamoto sugeriu Marcel Deiss Gewurztraminer, um branco geladinho, com notas florais e aromas de frutas exóticas. Saquê: provavelmente ele vai recomendar o Yamadaho, seco mas delicado.
  9. Não despreze a sobremesa. Ela estará sempre à altura da criatividade que desfila à sua frente nessa noite. Pode ser um refrescante sorvete de maçã verde com gelatina de saquê. Ou então, tempura de figo, escoltado por uma bola de sorvete da mesma fruta.
  10. E na próxima visita experimente pedir meia degustação de sushi. E complemente com pratos quentes, que são um capítulo à parte.

Agora, com exclusividade, vamos revelar o segredo do arroz perfeito de Jun Sakamoto.

 

O programa Saberes dos Sabores foi ao ar pela extinta JBNTV, em 2009 e constou de 10 programas sobre os conceitos da culinária japonesa. Apresentação do chef Carlos Ribeiro.

Jun Sakamoto

R. Lisboa, 55, 05413-000 Pinheiros, São Paulo, SP [Telefone]  11-3088-6019

Seg. a qui. 19h/0h30; sex. e sáb. 19h/1h

Menu Degustação: R$ 330,00

Cartões de crédito: A/D/M/V  Cartões de débito: M/R/V

Ostra à milanesa (kaki furai), com tomate picado. Foto: Andreas Heiniger

 

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