A floração das ameixeiras antecede à das cerejeiras no Japão e são até parecidas na aparência. As flores de ameixeira começam a despontar em fevereiro, muitas vezes em plena neve, o que cria um contraste maior na paisagem das suas cores. Já a colheita de seus frutos acontece em junho, época de muita chuva no Japão.
A ameixa umê é desde tempos remotos, um dos elementos mais representativos da culinária japonesa. O umeboshi, a ameixa em conserva no sal, é o acompanhamento básico para o arroz gohan e até lembra a bandeira do Japão.

É da terra das ameixas que vem este projeto. A província de Gunma é a segunda maior produtora de ameixa no Japão, depois de Wakayama. O Ministério da Agricultura, Silvicultura e Pesca do Japão informa que foram produzidas em 2018, 5.470 toneladas de ameixa, que são transformadas em conserva salgada (o umeboshi) e também em pastas, geleias e até chips. A ameixa umê é muito apreciada na produção de bebidas licorosas (o umeshu) e é usado, evidentemente, nas preparações de doces.
A cidade de Takasaki, importante polo produtor desses produtos, é também conhecida pela produção dos bonecos Daruma, que são considerados amuleto da sorte. Artesãos, que são chamados de shokunin, transmitem a técnica e os saberes da confecção dos bonecos daruma de geração a geração, e cada um desses profissionais são movidos por uma obsessão pela perfeição e excelência, coisa que os japoneses denominam de kodawari.
A Jetro – Japan External Trade Organization – criou então um evento onde une a degustação de alguns insumos derivados do umê com a divulgação da cultura do Daruma. Convidou o chef Akihiko Ida, chef executivo de cozinha do Hotel Metropolitan Takasaki para assinar um almoço degustação juntamente com a chef Telma Shiraishi, embaixadora da boa vontade para a culinária japonesa no Brasil. Integraram a comitiva de Takasaki, representantes da prefeitura e um artesão de bonecos daruma, que conduziu um ritual de pintura do olho do boneco. Diz o costume que você deve fazer um pedido e pintar um dos olhos. A pintura do outro olho fica reservado quando você conseguir realizar esse desejo.

Os convidados foram conduzidos para adentrar o salão do Restaurante Aizomê Japan House, e experimentar alguns dos rótulos de saquê. Meu companheiro nesta degustação foi o editor-sênior da revista Veja São Paulo, Arnaldo Lorençato, que havia retornado de uma viagem de quase um mês pelo Japão, país que ele conheceu há 14 anos, a convite da Fundação Japão. Tínhamos então muito assunto para atualizar e o nosso encontro foi muito apropriado.

Resolvemos experimentar três saquês, em pequenas doses. Começamos por um dos mais leves: o saquê espumante Osakazuki Jun-Nama, bastante frutado, acreditamos que devido ao komekoji (o arroz maltado) na composição. Ideal para consumir bem gelado. Pulamos então para o Nigori Genshu, um saquê muito leitoso, também produzido com komekoji, mas de sabor mais intenso.
Três amostras de shoyu da região também despertaram nossa atenção. São molhos produzidos pela Arita-ya, uma tradicional fabricante de shoyu fundada em 1832 com sede na província de Gunma, . Para ser experimentado com uma pequena colher, da direita para a esquerda: 1) Shoyu artesanal Ten-nen Jozo Shoyu, com fermentação de dois anos (os shoyus mais populares fermentam por 6 meses), com sabor profundo 2) Saishikomi Shoyu: preparado com dupla fermentação, utiliza como base o ten-nen Jozo Shoyu, que já fermentou por 2 anos, e descansa mais um ano fermentando, totalizando 3 anos de fermentação. Com isso, seu sabor é muito intenso. de forte personalidade 3) Ibushibishio, edição limitada, shoyu defumado, utiliza o mesmo processo francês de defumação e aromatização.

A degustação

A sequência se inicia com uma dose de umeshu, o licor de ameixa. Eu particularmente, sempre gosto de iniciar uma refeição que promete ser intensa em experiência, com uma dose de umeshu bem gelado. Este umeshu é feito com ameixa umê e saquê, de dulçor contido e uma acidez elegante e foi servido à temperatura ambiente. Gostaria de provar gelado.
Duas entradas, com características bem distintas em um mesmo prato comprido, assinado pela ceramista Hideko Honma. Um foi uma marinada de pargo, no sakekasu, a borra sólida resultante da produção do saquê. O pargo ainda foi temperado com “kakeru umeboshi”, um tempero pronto de umeboshi em pasta e vinagre de ume, da produtora Yuasa Nouen. Notamos a presença de um sal de forte personalidade. A chef Telma nos informou que é um sal de origem chinesa, realmente de sabor profundo que realçou o sabor do peixe. O sal foi trazido pelo chef, assim como a maioria dos temperos.


A outra entrada foi um rosbife ao molho vinagrete, onde incrivelmente, o vinagrete era o principal, com azedume suave e presença intensa do salsão, que se mescla ao pepino, tomate, pimenta malagueta e folhas de menta, com pingos de limão siciliano. A carne utilizada foi a costela bovina. No fundo de tudo, um molho “Kakeru Ume shoyu”, feito com pasta de umê e Yugeta Shoyu, fermentado em tonéis de madeira, para ser regado levemente.


Na sequência, um linguado brasileiro à Belle Meunière, com molho de maracujá. Harmonizou bem com o saquê Ôsakazuki Junmai, bem seco, produzido com arroz e komekoji (arroz maltado).

Bife de costela de boi à fondue de cebola roxa, com um toque de polpa de umê na finalização. O bife de costela ficou marinando em molho de sakekasu para depois ser frito em frigideira. Na cobertura o bife, foi usado o Karinko Ume, ameixas cortadas em pequenos pedaços, temperada com folhas de shissô. A carne acompanhou um shochu (aguardente) de arroz, servido em copo, com enorme bloco de gelo, on the rocks.
Mais um exemplo de como o umê pode servir como tempero. Aqui ele esteve presente na forma de chips (umê karinko) para o Tanuki Udon de Takasaki. Acompanhou uma dupla de oniguiri, um com recheio de umê e outro com um chirimen de pargo e linguado. O chirimen foi feito com aparas dos peixes, desfiadas e grelhadas.


E para fechar o dia, um sorbet de amazake de Kojiya Tobe, com geleia de umê. A folha de hortelã foi um detalhe que alavancou a refrescância desta sobremesa.




Veja abaixo a galeria de imagens do evento. Fotos de Edson Kumasaka.


SABORES DO JAPÃO: Takasaki Food Experience
Quando aconteceu o evento: 17 de fevereiro de 2020, das 12h às 14h
Quem promoveu: Jetro – Japan External trade Organization e Câmara da Indústria e Comércio da Cidade de Takasaki
Onde aconteceu: Aizomê Japan House
A Jetro – Japan External Trade Organization é uma organização oficial de comércio exterior e investimentos do Japão, sem fins lucrativos. Fundada em 1958, possui rede de representação em todas as províncias do Japão e está presente em 54 países. Em São Paulo, seu escritório fica na Alameda Santos, 771 – Cerqueira César.
Veja a Galeria do evento. Todas as fotos abaixo, crédto: Edson Kumasaka