Lembranças de Saul Galvão

Saul Galvão foi um dos pioneiros da crítica gastronômica brasileira, falecido em 2009. Por várias décadas trabalhou no jornal O Estado de S.Paulo e no extinto Jornal da Tarde, especializando-se em vinhos, cujo tema marcou sua carreira profissional. Publicou oito livros que viraram referência para os brasileiros que começaram a apreciar a bebida por intermédio de suas observações.

No O Estado de S.Paulo, atuou na crítica gastronômica e foi um dos criadores do caderno Comer e Beber. Descobrimos em nossos arquivos, esta matéria que Saul Galvão fez, sobre gastronomia japonesa, de julho de 1984, numa época em que os restaurantes nipônicos  se concentravam no bairro da Liberdade e eram voltados mais para a comunidade nipo-brasileira. Neste cenário, o Suntory brilhava praticamente sozinha com sua proposta de alta gastronomia e requinte. Foi ali que o crítico Saul Galvão encontrou o jovem Masanobu Haraguchi, então chefe de cozinha do suntuoso prédio, único na época que foi especialmente projetado para abrigar um restaurante.

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Saul Galvão partiu, e Haraguchi prosseguiu sua trajetória, marcando forte presença no restaurante Miyabi, dentro do edifício Top Center, na avenida Paulista, e recentemente, abrindo seu próprio restaurante, o Ban, na Liberdade, praticando uma cozinha autoral.

Aqui neste artigo, vemos um didatismo que se preocupa em introduzir o público brasileiro, ao ainda novo universo da culinária japonesa. “Uma culinária sutil, de receitas leves, naturais. E bonitas”, assim resume Saul Galvão, na abertura do artigo.

Alguns trechos, que merecem ficar registrados.

Ilustração: Chico Caruso

A cozinha japonesa procura uma harmonia entre as quatro estações, cinco cores, as cinco maneiras de preparar os alimentos, a conjunção entre as origens do prato, a temperatura certa e a visualização”.

O Restaurante Suntory é o atual Shintori, e conserva a arquitetura original, que é descrita aqui por Saul Galvão: “Ele é um dos poucos restaurantes cujo prédio foi especialmente projetado para esse fim….tudo foi concebido para tentar reconstruir o ambiente de uma casa típica japonesa, a começar pelos materiais empregados: muita madeira, portas corrediças e paredes de papel arroz, até o jardim interno, com árvores anãs e o lago com as carpas coloridas, que reflete o amor à natureza”.

E há achados fantásticos no artigo de Galvão, por onde poucos críticos hoje ousam transitar, que é no terreno das sensações. “As estações têm suas relações com os gostos. O salgado com todas as estações; o amargo com a primavera; a acidez com o verão; o outono com a satisfação tátil e o inverno com o doce”. “As cores devem harmonizar: o branco, o preto, o vermelho, amarelo e o azul e as maneiras de preparar os alimentos são a fritura, os pratos assados, os preparados no banho-maria, os cozidos e os crus, tão presentes na culinária japonesa”. “Tudo isso segue uma ordem lógica nem jantar típico, o kaiseki”.

Uma das últimas aparições públicas de Saul Galvão. Degustacao de vinho com Luiz Horta, Saul Galvao, Didu Russo, Jose Luiz Pagliari, Sergio Inglez e Alvaro Cesar Galvao. - FOTO JB NETO / AE
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