O Sabor do Chá Verde sobre o Arroz (Ochazuke no Aji | お茶漬けの味)
Produção: Shochiku
Ano de Produção: 1952
Direção: Ozu Yasujiro
Roteiro: Noda Kogo, Ozu Yasujiro
Fotografia: Atsuta Yuharu
Montagem: Hamamura Yoshiyasu
Direção de arte: Hamada Tatsuo
Música: Saito Ichiro
Produção: Yamamoto Takeshi
Elenco: Saburi Shin | Kogure Michiyo | Tsuruta Koji | Ryu Chishu | Awashima Chikage | Tsushima Keiko | Miyake Kuniko | Yanagi Eijiro | Uehara Yoko
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Sinopse
Satake Mokichi e Taeko estão casados há muitos anos. Foi um casamento “arranjado”, chamado de “miai”. Insatisfeita com o casameto, Taeko passa a maior parte do tempo com as amigas, entre elas Aya, uma estilista, e Takako, cujo marido está em viagem. Frequentam restaurantes, teatros e estações termais. Os pais de Setsuko, sobrinha de Taeko, estão ansiosos em arranjar um casamento para ela. Setsuko sabe que a tia não está feliz com o seu casamento e por isso é contra um casamento assim. Setsuko insiste com os pai que só se casará com um homem que ela ame de verdade. Mas os pais insistem em lhe arranjar um noivo, e marcam um encontro de Setsuko com o pretendente em um teatro.
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Mokichi e o amigo planejam ir às corridas. Fugindo do teatro, Setsuko vai para a casa da tia. Lá, Mokichi a convida para ir à corrida, e depois a um fliperama. Por Setsuko não ter comparecido ao compromisso, Mokichi e a sobrinha encontram Taeko possessa, quando retornam à casa. Assim começa uma guerra entre Taeko e Mokichi, que perdura por vários dias. Uma noite, no jantar, Taeko critica duramente os modos de Mokichi à mesa. Ele explica que gosta de uma vida simples enquanto Taeko insiste que fora criada para levar uma vida de classe. Taeko resolve sair de casa. A empresa de Mokichi decide enviá-lo para o Uruguai, a negócios. Quando ambos se encontram novamente, a relação deles passa por uma profunda transformação.
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Curiosidades sobre o filme
Uma pesquisa realizada no início da década 50, quando o filme “O Sabor do Chá Verde sobre o Arroz” foi filmado, revelou que 45% dos japoneses preferiam os anos 30, comparado à época do pós-guerra. Ozu foi influenciado por esta pesquisa. Os anos 30 eram vistos como era de inocente felicidade. Nos comentários sobre as diferenças de classe, Ozu explora os espaços com alguns movimentos de câmera, que acompanham personagens ou mesmo objetos, um recurso raro na linguagem de Ozu, que abandonará por completo o movimento da câmera em seus filmes subsequentes, como em “Era uma vez em Tóquio” (Tokyo Monogatari). Em “O Sabor do Chá Verde sobre o Arroz”, Ozu lança mão de uma técnica narrativa muito peculiar a ele: o “gancho falso” do diálogo, que cria expectativas de vermos, em contracampo, personagens que ao final, nem aparecem no filme. Neste filme, Ozu explora também a modernização do Japão no pós-guerra, invertendo as relações costumeiras, mostrando o comportamento de um homem sob o ponto de vista da mulher. A harmonia conjugal em crise é o tema do filme, mas apresentado com delicado humor e uma boa dose de resignação.
A magia de Ozu
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Ele nasceu (1903) e morreu (1963) na mesma data: 12 de dezembro. Fez o mesmo tipo de filme em toda a sua carreira. Empregou praticamente os mesmos atores, em situações semelhantes. Mesmo assim consagrou-se como um dos cineastas mais inovadores, capaz de arrancar um documentário-homenagem de Wim Wenders. Ozu Yasujiro (1903-1963), um poeta do cotidiano, um retratista dos encantos da rotina pode ser encontrado num box de DVD com o título O Cinema de Ozu (Versátil) com cinco títulos: Era Uma Vez Em Tóquio (Tokyo Monogatari), Também Fomos Felizes (Bakushu, 1951), Era Uma Vez Um Pai (Chichi Ariki, 1942), Crepúsculo Em Tóquio (Tokyo Boshoku, 1957), Filho Único (Hitori Musuko, 1936), todas em cópias restauradas, seguindo uma onda de recuperação de clássicos que está avançando no Japão. No Japão há versões em 4K de muitos filmes incluindo Era um vez em Tóquio, sua obra prima.
Uma das características estéticas do cinema de Ozu é a câmera baixa, sempre fixa, um pouco abaixo do olhar de uma pessoa sentada no tatami. Não há efeitos, nem dramaticidades. O plano fixo é uma abertura para as sugestões, pois a câmera não dirige o olhar nem influencia opiniões. É assim em Era uma Vez em Tóquio, quando um casal que vive no interior resolve ir visitar os filhos, que moram em Tokyo. Só que a vida na cidade grande não é aquela maravilha para ninguém. Os pais se tornam um incômodo para os filhos, e a única pessoa que os acolhe com carinho é a nora viúva, aquela que não tem mais nenhum parentesco com o velho casal.
O público precisa se acostumar com a linguagem do silêncio que permeia todos os filmes de Ozu. São as inflexões do “ma”, o espaço intervalar, denso, por vezes cruel. Em muitas ocasiões, o silêncio pode permanecer minutos, e crescer em dramaticidade explosiva sem que ninguém levante a voz. Daí o encanto revolucionário do cinema de Ozu. É um cinema que não exerce ódio, rancor, nem crítica social. Apenas aceita os fatos da rotina e do cotidiano, com a vida é.
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Ozu nasceu em Tóquio, no ano em que foi inaugurada a primeira sala de cinema no Japão. Sob a formação da era Taisho (1912-1926), de espírito liberal, burguesia em ascensão, otimismo reformista, Ozu tinha uma paixão pelo debate intelectual. Por isso fugia da escola para assistir Chaplin, Pearl White, Lilian Gish e William S. Hart. Desde cedo interessou-se pela arte do cinema e pela literatura moderna. No verão de 1923 ingressa na produtora Shochiku, em Kamata, como assistente de fotografia. Assim se enturmou com diretores e roteiristas consagrados como Naruse Mikio, Uchida Tomu, Gosho Heinosuke, Noda Kogo. Mas no ano seguinte, Ozu é convocado para a reserva do Exército. Retorna ao cinema em 1926, promovido a assistente de direção. Na década de 30, quando o Japão se movia para o ultra-nacionalismo, com a economia toda voltada para a guerra e a política visar o expansionismo, Ozu começou a ser reconhecido. Seus filmes ganharam o prêmio de Melhor Filme do Ano, na votação da revista Kinema Jumpo.
Com a deflagração da Guerra Sino-Japonesa, Ozu é recrutado novamente e enviado à China e Ozu interrompe suas atividades no cinema, onde ele retornaria somente em 1940. O Irmão da Família Toda, realizado em 1941 recebe novamente o prêmio de Melhor Filme do Ano, pela Kinema Jumpo. Mas mais um convocação, agora para Singapura, para realizar filmes de propaganda nacionalista, interrompe suas atividades na Shochiku. Mas desta vez, Ozu resolve aproveitar o momento para assistir a filmes americanos, como Cidadão Kane, Vinhas da Ira, Rebecca, Fantasia, E o Vento Levou…, No Tempo das Diligências e Como era Verde o meu Vale, segundo seu próprio relato. Quando a Inglaterra tomou posse do país, Ozu se tornou prisioneiro de guerra e ficou num campo de concentração.
Retornou ao Japão após o fim da Segunda Guerra, e acolhido novamente na Shochiku, com sua posição consolidada. A partir daí, Ozu entra na sua melhor fase, dirigindo Pai e Filha (1949) e Era uma Vez em Tóquio (1953), sempre em parceria com o roteirista Noda Kogo.
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Em 1958 recebeu prêmios do MInistério da Educação e do Imperador. Em 1959 foi o primeiro diretor de cinema a ser eleito para a Academia Nacional de Arte. Em 1963 submete-se a uma cirurgia para a retirada de um tumor maligno, seguida de radioterapia. Mas acaba morrendo na tarde de seu 60º aniversário. Suas cinzas foram depositadas no templo Engaku, em Kita-Kamakura. Na lápide, uma simples e única inscrição: Mu (無) , que significa o nada, o vazio. Uma referência à filosofia Zen budista.
Ozu era conhecido como um grande apreciador de bebida, especialmente quando escrevia os roteiros, com seu parceiro em quase todos os filmes, Noda Kogo. Via-se centenas de garrafas de uísque e saquê durante esse trabalho. Por isso, seus fãs, ainda hoje, quando visitam o túmulo de Ozu, levam garrafas de bebida, ao invés de flores.
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